Sunday, November 30, 2008

O mito da caverna

A grande contribuição da Filosofia é enquanto estimula o questionamento, a crítica, o distanciamento dos juízos tradicionais, a relativização e até destruição das verdades estabelecidas, a desconstrução da realidade através do questionamento incessante.

No momento em que começam a “encontrar” respostas, os filósofos acabam se perdendo em seu próprio mundo da imaginação. Criam verdades, logo em seguida esquecem-se que foram delas os criadores e passam a acreditar que as “encontraram” no próprio mundo. Ainda que em muitos casos, as dúvidas que os filósofos formulam sejam apenas uma introdução, uma preparação para chegar onde querem, estimulam o pensamento crítico e o questionamento, que são as ferramentas humanas para dar saltos de inteligência e consciência. Utilizemos a Filosofia como arma para investigar, questionar nossas verdades, questionar toda a tradição.

Vejam o Mito da Caverna de Platão. Um belo exemplo de como vivemos acreditando em verdades que não passam de fantasias.

É claro que podemos ainda questionar a "resposta" de Platão, para o problema. Não há para nós o "lado de fora", A "verdade". Porque toda verdade é uma fantasia. Porém, como disse, o que há de mais importante na filosofia, é justamente a capacidade de colocar o problema. A possibilidade viva de investigar e questionar sempre ainda uma vez mais. Filosofia é muito mais sobre perguntar do que sobre responder.

"SÓCRATES – Figura-te agora o estado da natureza humana, em relação à ciência e à
ignorância, sob a forma alegórica que passo a fazer. Imagina os homens encerrados em
morada subterrânea e cavernosa que dá entrada livre à luz em toda extensão. Aí, desde a
infância, têm os homens o pescoço e as pernas presos de modo que permanecem imóveis e
só vêem os objetos que lhes estão diante. Presos pelas cadeias, não podem voltar o rosto.
Atrás deles, a certa distância e altura, um fogo cuja luz os alumia; entre o fogo e os cativos
imagina um caminho escarpado, ao longo do qual um pequeno muro parecido com os
tabiques que os pelotiqueiros põem entre si e os espectadores para ocultar-lhes as molas dos
bonecos maravilhosos que lhes exibem.

GLAUCO - Imagino tudo isso.

SÓCRATES - Supõe ainda homens que passam ao longo deste muro, com figuras e objetos
que se elevam acima dele, figuras de homens e animais de toda a espécie, talhados em pedra ou madeira. Entre os que carregam tais objetos, uns se entretêm em conversa, outros guardam em silêncio.

GLAUCO - Similar quadro e não menos singulares cativos!

SÓCRATES - Pois são nossa imagem perfeita. Mas, dize-me: assim colocados, poderão ver
de si mesmos e de seus companheiros algo mais que as sombras projetadas, à claridade do
fogo, na parede que lhes fica fronteira?

GLAUCO - Não, uma vez que são forçados a ter imóveis a cabeça durante toda a vida.

SÓCRATES - E dos objetos que lhes ficam por detrás, poderão ver outra coisa que não as
sombras?

GLAUCO - Não.

SÓCRATES - Ora, supondo-se que pudessem conversar, não te parece que, ao falar das
sombras que vêem, lhes dariam os nomes que elas representam?

GLAUCO - Sem dúvida.

SÓRATES - E, se, no fundo da caverna, um eco lhes repetisse as palavras dos que passam,
não julgariam certo que os sons fossem articulados pelas sombras dos objetos?

GLAUCO - Claro que sim.

SÓCRATES - Em suma, não creriam que houvesse nada de real e verdadeiro fora das
figuras que desfilaram.

GLAUCO - Necessariamente.

SÓCRATES - Vejamos agora o que aconteceria, se se livrassem a um tempo das cadeias e
do erro em que laboravam. Imaginemos um destes cativos desatado, obrigado a levantar-se
de repente, a volver a cabeça, a andar, a olhar firmemente para a luz. Não poderia fazer
tudo isso sem grande pena; a luz, sobre ser-lhe dolorosa, o deslumbraria, impedindo-lhe de
discernir os objetos cuja sombra antes via. Que te parece agora que ele responderia a quem lhe dissesse que até então só havia visto fantasmas, porém que agora, mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais, via com mais perfeição? Supõe agora que, apontando-lhe alguém as figuras que lhe desfilavam ante os olhos, o obrigasse a dizer o que eram. Não te parece que, na sua grande confusão, se persuadiria de que o que antes via era mais real e verdadeiro que os objetos ora contemplados?

GLAUCO - Sem dúvida nenhuma.

SÓCRATES - Obrigado a fitar o fogo, não desviaria os olhos doloridos para as sombras
que poderia ver sem dor? Não as consideraria realmente mais visíveis que os objetos ora
mostrados?

GLAUCO - Certamente.

SÓCRATES - Se o tirassem depois dali, fazendo-o subir pelo caminho áspero e escarpado,
para só o liberar quando estivesse lá fora, à plena luz do sol, não é de crer que daria gritos
lamentosos e brados de cólera? Chegando à luz do dia, olhos deslumbrados pelo esplendor
ambiente, ser-lhe ia possível discernir os objetos que o comum dos homens tem por serem
reais?

GLAUCO - A princípio nada veria.

SÓCRATES - Precisaria de algum tempo para se afazer à claridade da região superior.
Primeiramente, só discerniria bem as sombras, depois, as imagens dos homens e outros
seres refletidos nas águas; finalmente erguendo os olhos para a lua e as estrelas,
contemplaria mais facilmente os astros da noite que o pleno resplendor do dia.

GLAUCO - Não há dúvida.

SÓCRATES - Mas, ao cabo de tudo, estaria, decerto, em estado de ver o próprio sol,
primeiro refletido na água e nos outros objetos, depois visto em si mesmo e no seu próprio
lugar, tal qual é."

Para baixar o mito da caverna completo:
http://www.4shared.com/get/16388560/dd41c33c/Plato_-_O_mito_da_caverna.html

Para baixar "A Republica" completo:
http://www.4shared.com/get/49758760/36cef78/Plato_-_A_Republica.html

Saturday, November 29, 2008

O sentido da vida

Nossa existência é solitária e ao mesmo tempo coletiva. Pois aquilo que nos une a todos é também o que irremediavelmente nos separa. Aquilo que todos temos em comum, é também e só pode ser, de cada um: A nossa incurável e absoluta solidão.

E o sentido para estarmos aqui? A pergunta, para mim não é mais “Há um sentido para nossa vida?” Nem tampouco “Qual o sentido de nossa vida?”. A pergunta, tanto libertadora quanto assustadora, porém de qualquer forma fascinante, é a seguinte: “Por que tem de haver um sentido para a nossa existência?” E não vejo um porquê. Apenas vejo que nos consideramos importantes demais para não termos sentido. Importantes demais para sermos passageiros como tudo é. Passageiros como a flor que morre, como a nuvem que se desfaz, ou como a mosca que esmagamos sem piedade, sem nem pararmos para nos perguntar para que mundo distante terá ido.

Amigos, por que haveríamos de querer nos encarcerar num sentido único e imutável? Por que buscar um sentido “verdadeiro”? Por que buscamos loucamente as correntes? Se não podemos vê-las nem senti-las, por que procurar por elas? Por que se recusar de todo jeito a ser um pouco mais livre? Por que tem de haver um sentido para a vida? Ficaria o pássaro pousado num mesmo galho a vida inteira, angustiado e pensando: “Onde está a gaiola?” Então por que nós, os importantes, nós, os evoluídos, precisamos de tantas correntes e bolas de ferro? É tudo sem sentido! É tudo com todo o sentido! E esse é um grande benefício! O sentido é um hoje e outro amanhã. O sentido é nenhum e é todo o resto. É cada fantasia que pudermos criar. É a existência, sem sentido, indiferente e já repleta de sentido, simplesmente por existir. “Onde está a gaiola?”, “Onde está a gaiola?” Voa!

Friday, November 28, 2008

Sob o ponto de vista da eternidade

Acho que Spinoza estava certo... Às vezes é muito bom ver as coisas "sob o ponto de vista da eternidade". Assim nos lembramos o quanto nós somos pequenos, o quanto nossos problemas são insignificantes. Que somos nós sob o ponto de vista da eternidade? Nada... Surgimos, passamos, e o mundo continua girando.. não se sabe porque.. mas ele continua. Absolutamente indiferente a nós.

Somos bilhões de pontinhos minúsculos dentro deste pontinho que é a Terra. É isso que somos. E aqui vivemos, cada um no seu próprio mundinho, cada um no seu próprio sonho. Inconscientes. Inconscientes de estarmos inconscientes. E daí por diante. Caberia repetir agora a pergunta de Pascal: “Que é um homem no infinito?”.

Nos preocupamos demais. Temos problemas tão grandes, tão relevantes e ao mesmo tempo tão pequenos e mesquinhos. Nos preocupamos demais com o nada que somos: pontinhos num pontinho.

Imaginamos e acreditamos que somos muito importantes. Os mais importantes do mundo, os únicos seres vivos do Universo inteiro. Acreditamos que temos algo como uma alma grandiosa e eterna, acreditamos, até mesmo, que temos um Deus só para nós. Um deus que está nos observando, nos vigiando, cuidando de nós, e mais! Acreditamos que há um deus que nos recompensa se fazemos algo de “certo”, que nos castiga se fazemos algo “errado”. Parece ridículo se colocado desta forma, não? "Deus", um ser infinitamente poderoso e perfeito que se preocupa em vigiar e castigar um dos bilhões de pontinhos que viajam na Terra, porque ele fez algo de “errado”. Riam, riam comigo de nós mesmos. Até onde vai nossa imaginação. Até onde vai nosso egocentrismo.

"Sob o ponto de vista da eternidade", que somos nós? Que são nossos problemas e preocupações?

Thursday, November 27, 2008

A Verdade II

Nos colocamos, em geral, de 2 maneiras quando se trata da "Verdade" e do "Conhecimento".
Ou pensamos que nossa percepção - seja qual for - é a verdadeira,
ou pensamos que nossa percepção é falsa e que por trás dela está escondida, "velada" - como gostam de dizer -, obscura, a "Verdade Verdadeira", absoluta, que não podemos alcançar (como em Kant), ou que podemos até contemplar (como em Platão).

No entanto, estou cada dia mais convencido de que a Mente humana é uma máquina delirante, uma máquina de fantasiar, uma máquina de sonhar.

Portanto, quando pensamos estar diante de uma Verdade, estamos mesmo diante de mais uma Fantasia. Se chamamos algo de "verdade", é unicamente porque assim acreditamos que seja.
Nosso cérebro é um artista! Cria realidades artisticamente!

E por trás desta Verdade delirada? Há a Verdade verdadeira? Não.. Não há nada por trás, velado, escondido.. Nada "fora", nada "além" do que há. E o que é que há?
Para nós? Sonho! Delírio! Fantasia!

Viver é Sonhar! A Verdade não é algo que se opõe à Fantasia. A Realidade É Fantasia.

despertei de súbito no meio desse sonho, mas somente para ter consciência que estava sonhando e que devo continuar sonhando para não perecer” - Friedrich Nietzsche (A Gaia Ciência)

Wednesday, November 26, 2008

A Imaginação

"A imaginação tem todos os poderes: ela faz a beleza, a justiça, e a felicidade, que são os maiores poderes do mundo" - Blaise Pascal (Pensamentos)


Todos nós, desde bem cedo, aprendemos a colocar em lados diretamente opostos “Realidade” e “Fantasia”. Mas vamos analisar com cuidado. Nossa mente, por associação, liga “Realidade” ao que é concreto, ao que é fato consumado, ao que existe, ao que é “verdadeiro”. E Fantasia, associamos ao que faz parte da imaginação, da ilusão, do sonho, da projeção. E é exatamente aqui que mora o problema: nessas associações, nessas definições.

Algumas perguntas martelam a duros golpes as certezas e verdades humanas: Afinal, ou a princípio, não sei, mas, o que é Realidade? E mais: Há algo que seja real? O que existe?

Em todas as coisas dos homens, em todos os conceitos, verdades, certezas, vejo imaginação. E a rápida e automática associação que a mente faz entre imaginação e fantasia, enquanto oposto de realidade, me faz pensar: Todas as coisas dos homens são Fantasia?

Nosso pequeno mundo é feito de coisas imaginadas que são ditas reais. Invenções da imaginação que acreditamos serem reais, válidas, legítimas, mas que, porém, não passam de invenções da imaginação. Acreditamos cegamente.

De tanto acreditar, conceituar, dividir, classificar, aprender os mesmos conteúdos já prontos há muito tempo, de tão habituados que estamos com tudo o que nos cerca, com tudo o que pensamos ver, ser e saber, já quase não nos questionamos mais sobre nada. Nossa mente, acostumada a percorrer os mesmos caminhos, fica enferrujada, viciada, limitada por limites muito mais estreitos do que os que ela pode alcançar.

Realidade? Que nada... Vivemos no Mundo da Imaginação!

Tuesday, November 25, 2008

A arte de questionar

Vivemos automaticamente, acreditando em montes de fantasias como se fossem as maiores das realidades. Vivemos acomodados, vivemos no conforto de nossas verdades pré-fabricadas.

Nos percebmos no mundo, isso assusta! E o que fazemos? Procuramos a primeira planície que encontramos para construir uma casinha confortável. Ora, por que não escalar montanhas? Por que não questionar, investigar, tentar entender? Se há para nós esta possibilidade, por que não nos utilizarmos dela? Por que nos acomodar sobre nossas verdades ao invés de usá-las como degraus e saltar por sobre elas? Por que não ir além? Podemos ir além! Podemos dar saltos cada vez maiores de consciência, de inteligência.

O que tem nos faltado? Força? Coragem?



Força! Coragem! Questionemos!

A Verdade

Que é, pois, a verdade? Um exército móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, numa palavra, uma soma de relações humanas que foram realçadas poética e retoricamente, transpostas e adornadas, e que, após uma longa utilização, parecem a um povo consolidadas, canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões das quais se esqueceu que elas assim o são

Friedrich Nietzsche - "Sobre a verdade e a mentira em sentido extramoral"

Que é a verdade? Algo fixo? Imutável? Eterno?
Muitas vezes, ao longo da história, acreditamos ter finalmente encontrado a verdade.
Mesmo no dia-a-dia, vivemos de acordo com uma série de conceitos, valores, sentidos, regras, deveres, proibições, que acreditamos serem verdadeiros.
Mas, será que há mesmo algo que seja verdadeiro, ou somos nós que estamos muito acostumados, muito acomodados para questionar a validade de nossas verdades?
Basta examinar com um pouco mais de cuidado e um tanto de coragem, e logo percebemos que a verdade é absolutamente variável, no tempo e no espaço. O que era verdade ontem, já não é mais verdade hoje. O que é a verdade aqui, não é verdade em outro lugar. E vice-versa e assim por diante.
Quantas coisas que tomamos pelas mais certas e verdadeiras, não serão apenas Fantasias de nossa imaginação?
Às vezes julgamos estar no caminho certo, enquanto o outro está no caminho errado. Julgamos estar de posse de uma verdade, enquanto os outros estão iludidos com mentiras.
Mas, se paramos para questionar, analisar, investigar, fica claro, muito claro, que a Verdade é apenas uma Fantasia. Uma Fantasia que julgamos ser real. Uma Fantasia que finge não ser fantasia. Uma invenção, uma construção. Nada mais.
Se tivermos força e coragem para questionar, perguntar, investigar, escalar as montanhas de nossa mente, o que encontraremos lá no topo? A verdade? Talvez nos deparemos com algo tão libertador quanto perturbador: "Nada é verdadeiro, tudo é permitido" (Friedrich Nietzsche - "Genealogia da Moral")

Termino este post com Fernando Pessoa:
"A Terra é feita de céu
A Mentira não tem ninho
Nunca ninguém se perdeu
Tudo é verdade caminho"

Monday, November 24, 2008

Perguntas e mais perguntas...

O que é Realidade? O que é verdade? Quantas das nossas certezas estão mesmo certas? Quanto conhecimento temos acumulado? Quanto mais podemos conseguir? Quantas coisas sabemos? Quantas coisas somos? Quantas coisas fazemos? Por que sabemos o que sabemos? Por que fazemos o que fazemos? Quantas coisas temos sentido? Quantas coisas têm um sentido? Será que algo em nosso mundo faz sentido? Quantas perguntas temos feito? Quantas mais podemos fazer? Estaremos muito ocupados para perguntar? Estaremos muito ocupados para pensar? Estaremos muito acostumados para nos espantar? Quantas respostas temos ouvido? Quantas respostas temos criado? E pra que responder, se posso ainda perguntar? Em quantas coisas acreditamos? Quantos caminhos já percorremos? Quantos ainda temos a percorrer? Quantos caminhos diferentes podemos percorrer? Por que somos o que temos sido? Quantas coisas nossa imaginação pode construir? Ou ainda, quantas coisas ela pode Desconstruir? Quais são os limites da nossa mente? Até onde ela pode ir? Até onde ela não pode ir? E a imaginação? Há limites para a imaginação? Quantos absurdos temos presenciado? Repito: Estaremos muito acostumados para nos espantar? Mas o que será absurdo? E o que não será? Será que existe algo normal? Mas o que será normal? E o que não será? Será que estamos dormindo? Será que estamos sonhando? Não será esta vida toda um grande sonho? Perguntas de mais? Ou serão ainda perguntas de menos?

A beleza não é ser capaz de responder, mas sim, sermos capazes de nos perguntar sobre tudo isso. Sermos capazes de nos surpreender com o mundo e com nós mesmos a cada dia. Sermos capazes de nos surpreender com o grande mistério do qual, querendo ou não, fazemos parte.

Bem vindo ao Mundo Filosófico